Escrever como quem respira: a coragem silenciosa das novas autoras brasileiras
- Thabata Lima François
- 10 de jun.
- 5 min de leitura
Atualizado: há 6 dias
Dri Satys escreve como quem sobrevive - com palavras que escapam do peito e fincam raízes em corações que ainda acreditam na força da literatura brasileira

A primeira impressão é a que fica. Para Dri Satys, por muito tempo, diante de alguém novo, surgia uma dúvida inquietante: me apresento pelo que sou ou pelo que faço?
A carreira militar era o que oferecia segurança, estrutura e sustento. Mas a escrita chegou como quem não pede licença - algumas páginas soltas, cenas capturadas no ar, pensamentos sem nome que, aos poucos, se tornaram matéria viva. Hoje, são o que move o seu mundo.
"Escrever é quando eu penso melhor - e também quando eu não penso em nada".
A clareza das palavras, aliada à vastidão que elas podem conter, levou Dri a um lugar onde nunca pensou estar: ser uma autora. Criadora de histórias, de afetos, de personagens que encontram leitores famintos por alento, por sentido, por um refúgio possível. Ela representa um tipo de coragem que nem sempre cabe nas vitrines da literatura brasileira. A coragem de escrever sem mapas. De confiar que de uma cena, de um sentimento bruto, pode nascer um livro inteiro - e de que esse livro pode tocar vidas.
Dri é uma dessas vozes que escrevem por necessidade, por amor e por um profundo desejo de pertencer à narrativa que estamos sempre escrevendo neste país: a de que a literatura brasileira ainda pulsa, e pulsa forte, mesmo que muitos ainda não saibam.
Chegar até aqui não foi um sonho de infância, mas uma consequência da vida. Nas páginas da vida, Dri percebeu que o dom habitava ali, quieto - de ínicio, inquietante, aguardando o momento de se fazer ouvir — até ocupar tudo, até transformar tudo. Desistir de uma carreira consolidada, de uma zona de conforto, de um caminho já traçado, exige um tipo raro de coragem. É dar um passo rumo ao desconhecido, ao instável, ao que atrai olhares tortos — e, ainda assim, sentir-se mais viva do que nunca.
“Depois que pedi desligamento, comecei a me apresentar como autora. Mas percebi que as pessoas não entendem isso como uma profissão. Parece um hobby. Olham estranho.”
A fala expõe uma ferida coletiva: ser autora, no Brasil, ainda é visto por muitos como passatempo. Quem vê de fora não enxerga a entrega, a pressão silenciosa, as noites insones, o esforço de construir personagens reais, e a necessidade de se derramar, inteira, em cada página.
E Dri se derramou - sete vezes. Com sete títulos publicados e disponíveis na Amazon, a autora soma mais de 77 mil avaliações. Em sua biografia, confessa que acha mais fácil escrever sobre seus personagens do que sobre si mesma. E, nesse gesto, há uma revelação: a literatura como espelho, como abrigo, como expressão mais honesta de quem se é. A paixão pelos livros sempre a acompanhou. Mas escrever... escrever foi surgindo como sussurro.
"Eu até arriscava escrever uma cena ou outra, mas nunca levava adiante — sempre preferi ler. Até que, de repente, comecei a achar muito mais graça na escrita. Mesmo assim, eu nunca terminava nada".
Aos dezoito, a vida a levou a outro caminho: passou em um concurso e se tornou sargento da Aeronáutica. Durante sete anos, atuou como controladora de voo — experiência que inspirou um de seus livros mais queridos pelos leitores, “Sob o mesmo céu”.

Mas nem a estabilidade da carreira militar, nem a instabilidade do voo foram suficientes. Aos 25, Dri arriscou tudo. Pediu desligamento e se lançou inteira na literatura - o voo mais desafiador de sua vida. Começou, então, a viver “o sonho que nunca se atreveu a sonhar”, como ela mesma descreve.
“A escrita sempre me fez sentir viva. Ela é minha forma de fugir dos medos, mas também me ajuda a enfrentá-los”.
Para muitos leitores, os livros são porto e farol. Espaços onde se projetam sonhos, medos, saudades… Em certos momentos da vida, tudo o que alguém precisa é de um livro que acalme a mente, clareie o coração, convide à imaginação. Dri sabe disso. E é por isso que escreve.
“Espero que o caos em minha cabeça te ajude a esquecer um pouco do caos da nossa vida”.
A coragem acompanha o processo de Dri em cada detalhe. Na sua primeira publicação, ela não fazia ideia de como colocar um livro à venda na Amazon. Mas não cogitou desistir nem por um segundo. Com garra, buscou vídeos no YouTube, entendeu o funcionamento da plataforma e, assim, deu o primeiro passo em direção a um caminho repleto de surpresas.
“E a carreira começou assim - meio como uma brincadeira. Eu não estava esperando ganhar nada com isso.”
A humildade na fala dela é evidente. Grandes escritores, muitas vezes, não se reconhecem como tal - e precisam de olhares de fora para perceber a grandeza das histórias que carregam. No caso dela, a fada madrinha foi uma amiga, que descobriu, por acaso, livros guardados como tesouros escondidos. Foi essa amiga que insistiu, impulsionou, acreditou - e fez com que Dri publicasse seu primeiro romance: “Meu Melhor para Você".
Bruno Rossi e Maitê nasceram ali - o primeiro casal do "Driverso". Assim que surgiram, conquistaram de forma irreversível o coração do público. Quem leu a história de amor turbulenta entre os dois médicos logo ansiou por mais. Mais dos dois. Mais dos personagens secundários. Mais de tudo que Dri ainda tinha a oferecer
“Depois que eu publiquei, criei uma conta no TikTok [...] fazia divulgação lá. Às vezes o vídeo batia 200 visualizações [...] e assim o livro foi crescendo.”
As redes sociais se tornaram a principal ponte entre Dri e suas leitoras. Em cada nota dos livros, ela convida ao diálogo — uma conversa íntima e honesta com quem mergulha nas suas páginas. A literatura, para Dri, nunca foi um monólogo. É troca, escuta, conexão.
“Ah, e em caso de surtos, minha DM está aberta (@autoradrisatys). Vou amar ver vocês tentando decidir qual é o favorito: Bruno, Leonardo ou Matteo”.
Nota da autora no livro “Lembre-se de mim”
Esse laço deu origem ao grupo de WhatsApp chamado "Driverso", onde mais de 200 leitoras acompanham os bastidores, dividem experiências, comentam cenas e personagens, e se sentem parte viva de cada história. Mais do que autora, Dri escolhe ser presença. Todos os dias aparece no grupo, interage, pergunta, acolhe. Conhece suas leitoras pelo nome. Leva em conta o que elas sentem, esperam, sonham. E, assim, transforma a escrita em um espaço de afeto compartilhado. Além disso, ela divide com o público parte do seu processo criativo, reiterando: escrever preenche sua alma. É abrigo, casa, encontro.

Em um país onde o talento feminino tantas vezes é silenciado ou tratado como passatempo, Dri Satys escreve como quem respira — não para agradar, mas para existir. E, ao existir com coragem, abre caminho para outras tantas vozes que também desejam ser ouvidas. Sua história é sobre livros, sim. Mas também é sobre persistência, comunidade e o poder de se reconhecer na própria narrativa. É sobre encontrar, na escrita, um lar — e fazer com que milhares de leitores também encontrem o seu.
Porque, no fim, escrever não é apenas contar histórias. É continuar vivo dentro delas.
Quando questionada sobre o que vem pela frente, Dri teve uma simples resposta, mas que continha a verdade mais valiosa.
"No futuro, o que eu sei é que vou estar escrevendo".
Parabéns pelo Texto Thabata.
Incrível, Thabata! Parabéns!
muito bom!
ficou incrível ❤️
Amei!!!❤️