Acessibilidade: um direito que exclui?
- Cláudia Resena da Silva
- há 22 horas
- 3 min de leitura

Olho o relógio. Estou atrasada, mesmo sem realmente estar. Caminho até o elevador como de costume e, como sempre, ele está lotado. Preciso esperar a próxima viagem. Quando finalmente consigo entrar, outras pessoas entram comigo. Eu as encaro e reflito: “Por que não usaram as escadas? Só para não chegarem cansadas?” Sempre penso nisso quando vejo alguém usar algo que, para elas, é só uma comodidade - mas, para mim, é essencial.
Ser uma pessoa com deficiência é um desafio diário. Sempre estive cercada de olhares estranhos, piadas e deboches sobre a minha condição. Situações assim se tornaram comuns desde a infância - e continuam até hoje.
Lembranças
Era 2018. Na escola, tínhamos que fazer uma apresentação de dança. A turma inteira se uniu para que eu não participasse, por causa da minha deficiência. No ano seguinte, a mesma situação se repetiu. Mas, dessa vez, eu tive voz. Tive coragem de dizer que sim, eu queria dançar. Pode parecer “bobo”, mas, para mim - uma adolescente na época - foi doloroso.
Exclusão, falta de amigos, nenhum convite para sair ou brincar. Eu via tudo isso acontecendo ao meu redor. Achava legal, bonito. Mas por que comigo era diferente? Era medo de me machucar? Vergonha? Nada fazia sentido.
Tentei procurar emprego ainda na adolescência, mas não consegui. Pensei que fosse por causa da idade. Mas, já adulta, cursando a faculdade, tentei de novo - achando que agora seria diferente. Mas nada mudou. Com o tempo, conheci o termo capacitismo e entendi, enfim, por que eu não conquistava o que queria.
A primeira coisa que notam quando entro em qualquer lugar são minhas pernas. É um olhar que parece dizer: “ela não é capaz”. Mas isso não é verdade. Por mais que eu tenha algumas limitações, isso não justifica a exclusão. As pessoas precisam parar de se contradizer. Uma hora dizem que é “frescura”, na outra, que somos “incapazes”. Nós queremos estudar, trabalhar, nos relacionar, nos divertir - como qualquer outra pessoa.
Dias atrás, fui usar um banheiro adaptado. Um detalhe importante: a maçaneta estava quebrada. Em outros, a porta sequer fechava direito. Como usar um espaço desses com segurança? Onde está a acessibilidade que tanto pregam? Já fui interrompida com alguém abrindo a porta enquanto eu estava lá. Já ouvi risadinhas, piadas. Muito engraçado, não?
Até mesmo no transporte, os olhares pesam. Quando chego atrasada, mesmo com todos sabendo da minha condição, escuto sugestões para sair mais cedo. Espalham boatos. Tudo isso... para quê?
Quando me deparo com a falta de acessibilidade, eu contesto - sem medo. Mas, às vezes, me pergunto: “Será que esse lugar ou essa pessoa sabe o que é acessibilidade? Ou acham que tudo é frescura?” Elevadores cheios, sem dar prioridade a quem realmente precisa. Rampas mal feitas, filas preferenciais que não funcionam, bancos reservados que nunca são ocupados por quem deveria.
São pequenas coisas que só quem é PCD consegue perceber. A maioria vive em seus próprios mundos, sem se dar conta do que acontece ao redor. Não enxergam o que não faz parte da sua realidade.
A inclusão, que deveria ser uma ponte para a acessibilidade, muitas vezes se transforma em exclusão. Acham que somos frágeis, que não damos conta. Mas tudo o que queremos é ser tratados como qualquer outra pessoa.
Este texto é o retrato de uma história real. A autora teve paralisia cerebral atáxica na infância, o que comprometeu sua mobilidade. Desde então, convive diariamente com a falta de acessibilidade e o julgamento dos outros.
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Adorei a crônica 🥹 são apenas algumas de muitas situações que uma pessoa com deficiência passa em seus dias! 👏🏼