Entre a saudade e o porquê da partida
- Daniela Dalmoro

- 8 de jul.
- 4 min de leitura
A intensidade e a interferência de um dia estar vivo

Dizem que pessoas boas morrem cedo. Talvez porque este mundo seja duro demais para quem sente demais. Talvez porque a missão de algumas almas seja breve, mas intensa. E, de alguma forma, eu me tornei uma dessas pessoas - não por ter sido perfeita, mas por ter entendido, tarde demais, o valor do amor e da vida.
“Devia ter amado mais, ter chorado mais, ter visto o sol nascer. Devia ter arriscado mais - e até ter errado mais, ter feito o que eu queria fazer”. A música dos Titãs tocava no carro naquela noite, e ela parecia escrita para mim.
Cada palavra era um espelho - não da vida que eu vivi, mas da que deixei passar. Das escolhas erradas. Do orgulho que me calou. Da saudade que guardei em silêncio por tempo demais. Talvez, se eu não tivesse guardado só para mim, estaria aqui ainda. Estaria ao seu lado, sentindo as batidas do seu coração.
Era tarde, e eu dirigia com o coração apertado e a cabeça cheia de lembranças. Depois de semanas afastados, depois de tantas brigas, tantas palavras não ditas - e outras tantas ditas da pior maneira -, finalmente tomei coragem. Peguei o celular e escrevi:
“Preciso falar com você. Estou indo. Te vejo em tudo. Te amo para sempre”.
Não sabia o que ele responderia. Nem se me receberia. Mas eu precisava tentar. Pela última vez. Talvez a dor da ausência era maior que o medo da rejeição.
Lembro de olhar pela janela e notar o céu limpo. As estrelas pareciam mais próximas, a lua estava cheia, e a brisa do vento fazia lembrar das noites que passamos juntos. Havia uma paz estranha no ar. E por um instante, mesmo dirigindo sozinha, me senti acompanhada. Como se algo - ou alguém - estivesse me guiando naquela noite.
Naquela estrada, tudo passava pela minha mente. O jeito que ele me olhava. As brincadeiras no meio do caos. A forma como ele se doava por mim - e como eu, egoísta, me afastava cada vez mais. Sempre fui boa em fugir, em levantar muros, em testar limites. E ele foi ficando para trás, enquanto eu corria de tudo, inclusive de mim mesma. Mas, novamente, eu digo: eu não queria. Eu juro que não queria me afastar de você.
A verdade é que a culpa era minha. Eu estraguei tudo. E só percebi quando já era tarde. Quando o silêncio dele já doía mais que as nossas brigas. Quando ele deixou de tentar. Porque até os mais pacientes se cansam. Até os mais apaixonados se perdem quando não são vistos. E até a chama mais ardente pode ser apagada quando sufocada.
Eu estava indo até ele para pedir perdão. Para dizer que estava grávida. Sim - ele ainda não sabia. Eu havia descoberto há uma semana. E, desde então, tudo dentro de mim mudou. De repente, não era mais só sobre mim. Nem só sobre ele. Era sobre nós. Sobre o que ainda podia ser. Imagina nós três, juntos. Estou rindo pensando nisso.
Mas eu nunca cheguei. Nunca pude viver essa imaginação com você.
Disseram que foi rápido. Uma curva mal feita, talvez um reflexo tardio, talvez o destino apressado demais. Não houve tempo para ligar. Nem para me despedir. Tentaram ajudar, mas eu já estava partida. Não só por fora, mas por dentro, desde muito antes daquela noite. Desde nossa despedida. Eu queria tanto ouvir seu perdão e dizer como eu te amava.
Ele soube no dia seguinte. Quando meu nome apareceu nas notícias. Quando viu meu rosto na tela do celular, pelas mãos de um amigo. Quando correu para o hospital, ainda sem acreditar. E lá, foi informado de que havia outro coração batendo dentro de mim.
Nós partimos para todo o sempre.
Nosso filho também se foi. Antes de nascer. Antônio. Eu nunca disse em voz alta, mas já tinha escolhido esse nome. Me pergunto, do lugar onde estou, se ele me perdoou. Se hoje ele entende que eu o amava, mesmo sem saber demonstrar. Que minha frieza era medo. Que meu silêncio era desespero. Que minha fuga era, no fundo, um pedido de ajuda. Mas eu demorei demais para voltar.
Ele, eu sei, segue vivendo. Com a dor, com a saudade, com a memória. E às vezes, quando o sol toca seu rosto pela manhã, ou quando o canto dos pássaros invade a janela, talvez ele sinta minha presença. Porque quem ama de verdade nunca vai embora por completo.
Eu fui embora amando. E amando profundamente ele e o nosso filho - que carrego nos braços aqui, nesse lugar que não sei ao certo onde é, nem qual nome leva. Espero te reencontrar aqui. Mas, além de buscar o reencontro, espero que você seja feliz. Com ou sem mim.
E espero que um dia ele entenda: que eu morri tentando amar da forma certa. Que a culpa era minha, sim. Mas o amor - o amor sempre foi nosso.
Meu eterno amor, te cuidaremos daqui.
Crônica inspirada em histórias reais, que juntas carregam a dor de perder pessoas amadas.




Cada palavra trouxe uma emoção diferente. Lindo texto e escrita ❤️